quinta-feira, 25 de março de 2010

Sergipe não precisa de usina nuclear


Precisamos, urgentemente, de aparelhos para radioterapia. O uso de energia nuclear não coaduna com nossa realidade e nossas oportunidades. E, além disto, a nossa Constituição (artigo 232, parágrafo 8), sabiamente, proíbe a instalação de usinas nucleares, bem como o armazenamento de lixo atômico no nosso território.

Sergipe não precisa de usina nuclear. Temos opções melhores e que não envolvem risco de acidentes radioativos desastrosos. Dentre estas opções vale ressaltar o uso de energia renovável. Por exemplo: a hidrelétrica, que ainda apresenta em nosso Estado um enorme potencial, a energia eólica, a solar e a alternativa de extração de energia do nosso bagaço de cana.

Outra forma barata de gerar energia é justamente economizando energia. Isto já foi demonstrado no Brasil pela PROCEL (Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica) que ao longo de 20 anos e com recursos da ordem de R$ 850 milhões, conseguiu economizar o equivalente à capacidade de geração de uma usina de 5124 MW, ou quase quatro vezes o potencial de Angra III (Angra III é um projeto parado há mais de 20 anos). Ou seja, com 12% do custo de Angra III, disponibilizou-se quase quatro vezes mais energia do que ela geraria.

Quanto à produção de energia por hidrelétricas, é conveniente recordar que no Brasil usamos atualmente apenas 30% do que poderíamos usar em hidrelétricas. Ou seja, ainda há 70% do potencial a ser explorado.

Com relação à energia eólica, de acordo com o Atlas Eólico Nacional, o potencial brasileiro é gigantesco. Chega a 143 mil megawatts (MW) considerando-se apenas a instalação em terra. Com turbinas no mar, o potencial é ainda maior. No Nordeste do país, o potencial eólico chega a 75 mil MW, dos quais 25 mil MW se concentram no Ceará. No entanto, aproveitamos hoje apenas 247 MW por meio de 16 parques eólicos distribuídos em oito Estados brasileiros.

De acordo com o caderno Opinião, do jornal Folha de São Paulo de 17/06/2006 em artigo assinado por Joaquim F. de Carvalho, mestre em engenharia nuclear, diretor, na época, da Nuclen “com os mesmos recursos previstos para a construção de Angra III, seria possível instalar um parque de turbinas eólicas com o dobro da potência em no máximo 2 anos, gerando 32 vezes mais empregos, sem trazer risco de acidentes graves ou produzir lixo radioativo.”

Questionado sobre o problema do lixo radioativo gerado pelas usinas nucleares, o professor Doutor José Goldemberg, PhD em física e professor da USP, respondeu à Revista Isto é Dinheiro, em 4 de maio de 2009: “Existem 70 mil toneladas de lixo muito radioativo só nos EUA.

Hoje eles ficam no mesmo lugar onde foram produzidos, pois não há lugar adequado para receber esse material. E esse lixo tem dois problemas. O primeiro é a possibilidade de vazamento de material radioativo, que tem um impacto devastador sobre o meio ambiente da região afetada. Em segundo lugar, existe o risco de segurança, pois a partir desses resíduos é possível obter plutônio, fundamental para a fabricação de armas nucleares. É exatamente o que aconteceu na Coréia do Norte. E ninguém sabe como se livrar desse lixo. Não é uma questão apenas do Brasil, mas de todo o mundo. Não há ninguém que tenha encontrado uma solução definitiva e segura para o descarte desse material. O próprio Ibama pediu um plano para o descarte do lixo, mas o problema é que não temos solução para isso, ninguém tem. Mesmo os EUA não têm mais dado licença para usinas, porque não sabem o que fazer com o lixo adicional.”
Indagado ainda pelo mesmo entrevistador sobre qual a sua opinião sobre o uso de energia nuclear para o nosso país, respondeu o professor Goldemberg:

“Isso pode muito bem ser o primeiro passo para se desvirtuar a matriz energética brasileira. É um enorme absurdo, ainda mais quando o ministro Lobão fala em construir 50 usinas nucleares no país até 2050. Não precisamos disso. No Brasil, a rede é toda interligada. Dizer que construir duas usinas nucleares no Nordeste seria uma forma de garantir a independência energética da região é uma bobagem. O que precisamos é usar melhor nossas reservas hidrelétricas. Apenas um terço do potencial dessa matriz é utilizado atualmente no país.”

“Agora, espalhar quatro reatores pelo país me parece mais uma tentativa de agradar aos governadores locais, que de responder a uma necessidade de energia. O sistema brasileiro é interligado. Quando se liga a luz da cozinha, não se sabe se a energia é de Itaipu ou de Tucuruí.

Dizer que é bom colocar um reator no Nordeste, pois assim o Nordeste ficará independente em energia, é uma falácia. Fazer novos reatores é politicagem” (professor Doutor José Goldemberg).

Depois dos acidentes nas usinas em Three Mile Island (1979), na Pensilvânia, e em Chernobil (1986), na Ucrânia, os EUA pararam de construir usinas nucleares. Portanto, há trinta anos que não se inaugura uma usina nuclear nos Estados Unidos da América. Diversas empresas ligadas ao ramo de construção destas usinas já abandonaram a atividade. A SIEMENS, na Alemanha, fechou a sua subsidiária (a mesma que vendeu para o Brasil as usinas de Angra). A General Eletric, nos EUA, também saiu do ramo. Sobrou somente a francesa AREVA, por um motivo especial. A França tem buscado reduzir a sua dependência energética da Rússia e dos países árabes e, por não possuir outra opção melhor, investe na energia nuclear. Este não é o nosso caso.

O Brasil e, em especial, o nosso Sergipe, tem outras opções, outros caminhos a explorar que, combinados entre si, podem muito bem abastecer o nosso Estado de energia limpa que não comprometa a nossa sobrevivência e a sobrevivência dos nossos descendentes. Estamos falando de material radioativo que lançado na natureza pode levar milhares ou milhões de anos emitindo radiação, contaminando o solo, a água, a atmosfera, os alimentos, os animais, etc. A meia-vida do urânio-235 é de 713 milhões de anos, a do urânio-238 é de 4,5 bilhões de anos, a
do plutônio-239 é de 241 mil anos e a do césio-137 é de 30 anos.

Lembrem-se do acidente de Chernobyl ocorrido em 26 de abril de 1986. (100 vezes mais radiação do que a bomba atômica de Hiroshima e Nagasaki, 400 milhões de pessoas expostas em 20 países, 4.000 casos de câncer da tireóide até agosto de 2005, além de milhares de casos de leucemia e outros cânceres, hipotireoidismo, mal-formações congênitas, Síndrome de Down, infertilidade e outros danos graves à saúde, conforme dados da International Atomic Energy Agency- www.iaea.org e da Organização Mundial de Saúde- www.who.int) Portanto, não precisamos de usina nuclear.

Na minha opinião, os nossos filhos merecem promessa melhor.
Finalizando, concordo com o prof. Goldemberg quando afirma: “O uso de energia nuclear não coaduna com nossa realidade e nossas oportunidades.”

O que o Estado de Sergipe necessita, urgentemente, é a instalação de, no mínimo, mais 3 aparelhos para radioterapia, da reativação do aparelho de braquiterapia (High Dose Rate-HDR) do Hospital João Alves e da construção do nosso Hospital do Câncer. Sem isto, vidas estão sendo perdidas diariamente. Sem isto, aqueles casos de câncer que, arduamente, conseguimos diagnosticar numa fase inicial da doença, estão evoluindo, diuturna e inexoravelmente, para formas avançadas. Sem isto, estamos, diariamente, assistindo ao sofrimento, ao desespero e a morte de pacientes e de entes queridos, que poderiam ser salvos.

Irrita-me, particularmente, quando leio nos nossos diários, a luta desenfreada, o desejo incontido pela instalação, apesar de todos os riscos, de uma usina nuclear em nosso Estado. Este movimento vem sempre atrelado à ideia de “1.900 empregos diretos e a um investimento de 4,7 bilhões de dólares”, diluídos em cerca de 5 anos de obras, quando em verdade necessitamos de tão somente alguns milhares ou milhões de reais para a construção do Hospital do Câncer, para a reativação do HDR e aquisição de alguns aparelhos de radioterapia, estes de imediato, que irão salvar milhares de vidas, ano após ano.

Convido você a refletir sobre o assunto. O tempo urge. O próximo paciente pode ser um de nós! Insisto, Sergipe não precisa de usina nuclear. Precisamos, urgentemente, de aparelhos para radioterapia.

International Member of American Society for Therapeutic Radiology and Oncology; Corresponding Member of European Society of Radiology; diretor Clínico do Instituto de Oncologia San Giovanni (Aracaju-SE); membro da Academia Sergipana de Medicina
soares.w@hotmail.com
http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/b/bb/Alternative_Energies.jpg

William E. N. Soares é médico, especialista no uso das radiações ionizantes - radioterapia

Texto publicado originalmente no Jornal da Cidade (www.jornaldacidade.net)



( Vamos em defesa da vida!!!! - usina nuclear NÃO!!!!!!!!!!)

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